Que o Brasil é o maior produtor de café do mundo, muita gente já sabe. Em volume de produção, não tem mesmo pra ninguém: são 43 milhões de sacas por ano, segundo a Brazil Specialty Coffee Association. Mais de 127 países do mundo têm cafés brasileiros nas suas xícaras.
Também somos o maior em exportação, posto que conquistamos em 1860, quando o país bateu o recorde ao exportar 26 milhões de sacas. Mas há outros fatos notórios que nós, brasileiros, deveríamos nos orgulhar quando bebemos café 100% nacional nas nossas xícaras.
Reunimos aqui algumas curiosidades para que você conheça (e respeite!) ainda mais esse grão que se tornou um símbolo do nosso país, né?
Tudo começou no Pará
O primeiro pé de café do Brasil não foi plantado no Sudeste, que se tornaria a maior região produtora do país, nem tampouco no Sul ou no Centro-Oeste. Foi no estado do Pará que a primeira muda foi introduzida no país, pelas mãos de Francisco de Melo Palheta, funcionário brasileiro a serviço de Portugal, que ocupou o cargo de sargento-mor no Estado. Foi em uma expedição à Guiana Francesa em 1727 que ele ganhou da esposa do governador francês Claude d’Orvilliers, um punhado de sementes e algumas mudas de café. Tudo clandestinamente, já que a exportação era proibida pela França. Depois, o desembargador Castelo Branco levou algumas mudas para o Rio de Janeiro, para fazer alguns experimentos. Por aprovação de Dom João VI, a então capital do país se tornara um grande cafezal no início de 1800.
O voo do café
O café – e a economia que gira em torno dele, claro – já ajudou o país em muitas conquistas. A invenção do avião por Santos Dumont foi uma delas. Toda a construção do 14-Bis foi financiada pelos lucros que o pai do inventor, Henrique Dumont, um dos primeiros “barões do café” do Brasil, teve com seus pés de café. Foi nas terras do pai, aliás, que ele começou a se interessar por máquinas e tecnologia, já que foi ali, no sítio Cabangu (Minas Gerais) onde Santos Dumont nasceu, que ele teve os primeiros contatos com elas. Daí para as invencionices foram um pulo, ou melhor, um salto, que terminou rendendo um voo – e o título de inventor do avião.
Comércio justo
O Brasil tem um dos mais elevados índices de fairtrade na produção cafeeira no mundo. São mais de 25 mil famílias com certificado no país, segundo números da Coordenação Latino-americana e do Caribe de Pequenos Produtores e Trabalhadores de Comércio Justo (CLAC Fairtrade). As vendas de café de comércio justo do Brasil apresentaram crescimento de 30% de 2015 para 2016. Além disso, o Índice de Preço Externo ao Produtor (IPEP) – que corresponde ao percentual do valor da receita com exportação repassado ao produtor – é de 85% nos últimos anos, o maior registrado no mundo. O nosso índice de “comércio mais justo” também se deve ao fato de nossas legislações trabalhistas serem muito mais rígidas que em outros países produtores, que levam os profissionais do campo a terem benefícios no valor adicional do salário (com aposentadoria, férias e décimo terceiro), além de terem suas funções respeitadas em horas de trabalho (8h por dia), EPIs, pagamento de horas extras, etc.
Muitas regiões
Alta Mogiana, Cerrado Mineiro, Sul de Minas… embora essas sejam algumas das mais conhecidas regiões de produção de café do país, elas representam apenas uma pequena porcentagem das áreas delimitadas da produção cafeeira brasileira. São 26 no total, segundo a divisão da BSCA, que engloba os estados de Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Rondônia, Bahia, Paraná, Pernambuco, entre outros. Das Montanhas do Espírito Santo ao Planalto Central, passando pelo Cerrado Baiano e pelas Matas de Minas, são regiões muito diferentes (poderíamos falar em terroir?) capazes de produzir cafés muito distintos, com características sensoriais bem diferentes. E você, conhece alguma além do tradicional?
Mulheres no café
Embora a história do café esteja mais ligada aos homens, houve muitas mulheres que ajudaram a transformar a economia cafeeira no país. Uma delas foi Sebastiana Cunha Bueno, esposa do Coronel Henrique da Cunha Bueno, que já era produtor dos grãos em Ipaussu, cidade em que foi prefeito. Mesmo após a queda do café em 1929 – com a quebra da Bolsa de Nova York, o principal efeito da crise manifestou-se na queda vertical dos preços de café no Brasil, maior produtor do grão – Sebastiana investiu na região da Alta Sorocabana, onde a família tinha terras, e funda duas fazendas de produção cafeeira. Além de administrar as terras, também ia a campo ver a produção. Por conta de seu espírito empreendedor, ela foi consagrada com a Medalha Perseverança honraria entregue pelo presidente Getúlio Vargas. Depois disso, ela mesma se tornou prefeita de Ipaussu, criou uma fundação para ajudar os moradores da cidade e escreveu seu nome na história da cafeicultura brasileira, embora seu nome seja mais conhecido em ruas de cidades da região de Marília e Presidente Prudente do que nos livros de café, mas deixamos aqui o registro.
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Rafael Tonon é jornalista especializado em gastronomia e amante (e produtor) de café. Escreve para diversos veículos no Brasil e no exterior sobre comida, bebidas, tendências e boas xícaras. É colaborador do Eater (www.eater.com), o maior portal de gastronomia dos EUA, e também escreve para veículos especializados em café, como a cultuada revista nórdica Standart.